Capítulo 5 (Parte 1)

E eu sabia ser feito de bobo, não sei se estava mais frustrado ou feliz, eu a beijei, ela me enganou. Porém se pudesse, faria tudo novamente. Sarah depois se mostrou um pouco magoada porque eu a beijei, eu não entendi, ela não tinha pedido?
- Era um teste seu bobo, não era pra me beijar.
- Então porque não desviou?
Ela ficou calada por um tempo.
- Você me pegou de surpresa...
Agora eu estava muito confuso pra saber se era mesmo verdade se aquele beijo tinha sido especial somente pra mim ou não. Estávamos voltando, andando lado a lado sobre a grama do quintal e ela agora falava como se nada tivesse acontecido, eu não me expressava muito, mas procurava disfarçar minha tristeza confundida com meu estado extasiado. Sem nenhum dos dois dizer qualquer coisa sobre onde íamos, acabamos no estábulo.
O espaço era amplo e aberto, chão de pedra, armação de madeira, com 5 baias do lado direito. Na primeira baia estava o cavalo de Sarah, um Palomino imponente e forte. Logo depois estava Lança, um belo cavalo negro calçado de brando nas quatro patas até os joelhos e um sinal, também branco, na testa. Mais a diante estava o asno, gordo e cinza com um jeitinho alegre que só os burros tem. A última baia estava vazia, digo, de animais, usávamos-a para guardar ferramentas e ração para os animais.
- Olá Andarilho, como estás? – Sarah perguntou ao cavalo palomino da primeira baia, pegou a raspadeira e entrou na baia para começar a escová-lo. Era seu cavalo, morria de ciúmes dele, brigaria com qualquer um que lhe montasse sem sua permissão, levei anos para notar o quanto Sarah era mimada. – Ivã, pegue pro Andarilho um pouco de milho, por favor. – pediu-me sorrindo gentilmente.
Fui até o saco, despejei de má vontade um pouco de milho no pote e o entreguei a Sarah, ela o despejou no cocho e continuou a acariciar seu animal, ao nosso lado Lança relinchava indignado pelo nosso desinteresse por ele, com pena também lhe servi um pouco de milho. Sarah me perguntou o porquê de eu estar tão calado, há! Como se não soubesse o motivo, ela sabia muito bem. Ficamos ali, calados distraindo-nos com os cavalos para não entrar em qualquer assunto, até que ouvimos passos se aproximando.
- Olá Ivã. Sarah? – era Thomas, tinha acabado de entrar e ao seu lado Charlie.
- Olá. – cumprimentou Charlie - A Senhora Coppais nos mandou cuidar dos cavalos. Aliás, ela está como louca atrás de ti, Sarah, disse-nos que você fugiu da vista dela mais uma vez hoje.
- Depois eu me resolvo com ela. E podem deixar que deste eu cuido. – disse Sarah com um sorrisinho, já fazia um tempo que Sarah e meus amigos se conheciam, poderiam se considerar amigos, mas Sarah ainda parecia insegura perto deles, principalmente de Charlie, falava com ele quando podia, mas não o olhava nos olhos, embora sempre o observasse quando ele não estava olhando.
Eu invejava Charlie nestas horas, eu queria não perceber, não saber que ela estava apaixonada por ele. Eu fingia que era mentira, ela também fingia, não contaria isso nunca a ninguém, era muito orgulhosa para isso. Charlie acenou em concordância com a cabeça pra Sarah e foi cuidar de um cavalo negro, Charlie era o tipo de garoto que nunca se sabia o que estava pensando ou sentindo realmente, por trás de seus atos havia sempre algo que nos fazia pensar qual era sua verdadeira intenção.
- Seria bom se pudéssemos fazer um passeio com eles qualquer dia, o que acham? – disse Thomas indo à direção ao asno, e se dirigindo ao asno começou a falar com uma voz retardada – Ia gostar, não ia burrinho?
- Acho que a senhora Coppais não deixaria – disse Sarah
- Por que não fala com ela Ivã? A Senhora Coppais confia tanto em você. – zombou Thomas
- Sarah poderia usar de seu charme feminino para isso. – comentou Charlie
- Mas fácil o Ivã usar do charme feminino – riu-se Thomas
- Meus caros, vocês não tem idéia o poder de sedução de nossa ilustríssima companheira. – sorri e ela me lançou um fulminante olhar cortante e desaprovador.
- Não duvido caro Ivã, não duvido nadinha. – disse Charlie encarando-a, e ela corou e se escondeu atrás do cavalo sem graça, eu notei, me senti idiota por ter dito aquilo e mais idiota ainda por Charlie ter conseguido deixá-la encabulada por minha culpa, mentalmente eu pensava: Maldição!
- Se bem que charme feminino não deve funcionar de mulher pra mulher... Funciona Sarah?
- Duvido disso Thomas, - falou ainda detrás de seu animal – Comigo não funcionaria. Seria perda de tempo falar com ela... Bem... O que acham de uma pequena aventura?
Acabamos decidindo que faríamos um pequeno passeio à noite sem a permissão da Sra. Coppais, nem nos arriscaríamos à pedir. Mas isso não era para aquele dia, precisávamos melhor planejamento, até porque seria preciso resgatar Sarah do seu quarto onde ela sempre dormia trancada e as chaves estavam sempre acompanhando a Sra. Coppais. Precisávamos de um plano.
Continuamos a conversar enquanto tratávamos dos animais, hora eu ajudava um, hora ajudava outro, nesse vai e vem desligado, fazia as coisas de modo automático, meio em transe, voltei a pensar no beijo, só pensava nele, agora me achava meio idiota por isso, será que Sarah também pensava nele? Eu queria beijá-la novamente, alias, queria beijá-la muitas vezes mais.

Era comum que Sarah passasse a maior parte da semana longe de mim. Víamos-nos menos depois do beijo, falávamos pouco, disfarçávamos nossos olhares encabulados, por alguns momentos pensei que não éramos mais amigos e me senti mal por isso. Pareceu-me que ela me evitava, ou seria eu que a evitava?
É impressionante como nós, seres humanos, temos a irritante mania de complicar as coisas simples, eu poderia simplesmente me declarar. E seria tão bom se ela me aceitasse, nada nos impediria de ficar juntos, fugiríamos, teríamos uma casinha pequena, do nosso jeito e ninguém nos incomodaria lá, seria nosso lugar, e só nosso, e pra lá fugiríamos e nos esconderíamos deste mundo que nunca nos fez bem. É impressionante também como nós, seres humanos, temos a irritante mania de sonhar muito alto, pois eu sabia, esse sonho era irreal.
Eu me sentia tão ridículo pensando sobre o amor, era algo só definido nas histórias fantasiosas de Alfie, era fantasioso demais amar, parecia que só eu amava, ao mesmo tempo achando que ela me amava e sabendo que era mentira. Eu as vezes me achava pessimista, mas não era. Em minha mente Sarah era a garota ideal, mas como todo ideal é só uma idéia nossa, e eu só fui descobrir isso bem tarde, Sarah não era tão perfeita como eu a via. Mas ela era a minha idéia preferida e continua sendo.

Ficamos uns dias sem vê-la, Sarah não tinha conseguido escapar de uma surra e um castigo. A Senhora Coppais estava preocupada com o futuro dela vivendo entre tantos meninos, dizia que teria que casá-la logo e quando o padre Fixar apareceu na terça-feira, como de costume ela discutiu o assunto com ele. Fiquei indignado ao saber que o padre tinha concordado. Logo ele que era tão nosso amigo. Ele ia trazer na próxima semana uma lista com os candidatos.
O que não faltavam a Sarah eram pretendentes e como a Sra. Coppais era sua responsável ficou encarregada de escolher um bom partido para ela. O padre Fixar conversou com Sarah, fiquei sabendo por um dos garotos, ela gritou e chorou, não queria se casar de forma alguma. Eu já tinha conversado o assunto com ela, Sarah não queria um marido arranjado pela Senhora Coppais, queria poder escolher um que amasse. Eu já sabia qual era sua escolha, não era eu. Mas eu não estava ligando muito pra isso quando ela me contara, era minha melhor amiga, por enquanto era o que bastava.
Reunidos naquela manhã fria de primavera às 05h30min eu, Charlie e Thomas estávamos reunidos com os demais garotos tomando nosso desjejum, leite e pão passado, já duro, do dia anterior. Nada que fosse novidade, mas conversávamos animadamente sussurrando sobre nosso passeio as escondidas ainda sem dia marcado, mas ainda tínhamos que bolar uma forma de fuga para Sarah para nosso passeio a cavalo. Eu continuava preocupado com a lista que o padre Fixar ia trazer, ele viria naquele mesmo dia à tarde.
Os rostos à mesa que nos observavam eram familiares, já faziam 6 anos que eu me juntara aos meninos, mas a verdade é que não éramos muito unidos, haviam grupos de 3 ou 4 meninos, normalmente se união pela idade ou por laços de sangue, os três garotos Gorson eram um desses casos, tinham chegado a uns 4 anos e andavam sempre juntos, tinham mais ou menos a nossa idade, mas eram fechados no seu mundinho, Thomas era da idade do irmão do meio e já tentara ser seu amigo, sem sucesso. À cabeceira da mesa estava Alfie, nesses 6 anos estava um pouco mais careca e gordo, o que, quando eu o conheci, acharia impossível.
A Sra. Coppais caminhava entre nós, às vezes espichando os ouvidos para tentar nos entender. Com o passar do tempo eu até passei a gostar dela, assim, ela era uma boa pessoa, só rabugenta e rancorosa, mas no fundo ela era boa e simples, embora no momento em que a vi naquele dia estava muito amargurado com ela naquele dia por conta do casamento que ela queria arrumar para Sarah. Em dias comuns eu sorriria e lhe desejaria um bom dia, mas dessa vez eu procurei ignorá-la e não falar com ela.
Todas as manhãs ela nos dava tarefas como, cuidar do jardim, animais, casa, etc. Aos garotos menores eram sujeitas tarefas mais simples como lavar a louça, varrer a casa e tirar poeira dos móveis, aos maiores as mais difíceis como consertar móveis e arar da pequena plantação no fundo do jardim. Eu e Charlie ficamos com a responsabilidade de consertar as telhas que tinham quebrado com um galho no dia anterior, estávamos reunidos na cozinha quando aconteceu, um estrondo que poderia ser confundido com o som da tempestade lá fora. Corremos para um dos quartos no segundo andar e nos deparamos com as camas cobertas com a água da chuva que ainda encharcava as encharcava, telhas quebradas e pedaços do que seria um galho absurdamente grande do carvalho do quintal.

- Ainda está escorregadio, - me alertou Charlie ao sumir por cima do telhado – Acho melhor deixarmos isso para amanhã. – ele gritou.
- Melhor não. – respondi já chegando ao final da escada que encostamos à parede para chegar ao telhado. – A Sra. Coppais ficaria muito zangada.
Passei as ferramentas para Charlie que em seguida me puxou para ajudar-me a subir no telhado, ao nosso redor tudo parecia meio nublado. Estava realmente perigoso, o telhado tinha criado uma espécie de limo que nos fazia derrapar e estava sujo pelo que pareciam anos de folhas. Caminhamos agachados tomando cuidado para não estragar ainda mais as telhas, elas tinham mais ou menos um palmo meu de largura e um pouco mais que meu braço de comprimento, por sorte o telhado era só ligeiramente inclinado. Arrastamo-nos até o rombo e olhamos o quarto abaixo onde alguns meninos limpavam a bagunça causada pela tempestade, os cumprimentamos e pusemos a por toras e a martelá-las num mesmo ritmo mecânico até que o único vestígio do acidente com o galho fossem as novas toras de madeira que se destacavam no telhado, agora já não estava nublado e o céu azul acima de nós esbanjava um sol branco e agradável.
Enquanto voltávamos e começamos a descer pela escada lembrei-me de uma coisa.
- Charlie, volte! Tive uma idéia.
Subi de novo ao telhado e olhei a minha volta calculando por baixo daquela multidão de telhas os cantos da casa. Alguns passos para frente... Virando a direita... Mais alguns passos... Comecei a remover os pregos de algumas telhas com o martelo, enquanto isso Charlie surgia novamente no telhado.
- O que está fazendo? – Perguntou-me.
- Procurando o quarto da Sarah.
Ele veio a mim e se abaixou começando a me ajudar a retirar as telhas. Quando tínhamos consertado o telhado notei que as vigas que sustentavam as telhas eram distantes o suficiente para que uma pessoa pudesse passar. A minha esperança é que desse para ver Sarah. Retiramos uma telha e olhei para baixo, era o quarto dela. Começamos então a tirar mais algumas.
O espaço que eu bem conhecia da época que a Sra. Coppais ficara doente continuava o mesmo, com a cama de Sarah no centro com mesinhas, uma de cada lado, um armário à esquerda e uma penteadeira com uma cadeira tripé à direita perto da grande janela com um parapeito de onde Sarah normalmente observava a vida lá fora. E lá estava ela, com um vestido branco simples, mas que nela parecia o mais belo que eu já tinha visto, seus cabelos negros estavam pretos por uma fita vermelha num rabo de cavalo. Ela olhava para cima, com certeza tinha percebido o estranho movimento sobre o teto. Assim que me viu abriu aquele claro sorriso surpreso. Ah! Como era belo aquele sorriso! – Ivã!!! – chamou-me alegre. – Eu estava agoniada sem você por tanto... – Ela parou de falar assim que Charlie surgiu ao meu lado.
- Oi Sarah. – disse ele sorrindo à minha esquerda.
- Ah... Oi. Como... Como chegaram aqui?
- A senhora Coppais nos mandou consertar o telhado, soube do que aconteceu ontem à noite no quarto do outro lado? – Charlie respondeu.
- Sim, ela me contou hoje quando me acordou. Não é meio perigoso ai?
- Oras... Meninos travessos aprendem a se virar. – Ele piscou e ela riu.
- Acha que consegue subir aqui, Sarah? – eu disse meio que tentando interromper os dois. E ela pareceu ter me notado novamente.
- Não sei. – Ela olhou para os lados a procura de algo – Talvez... Talvez se eu puder essa cadeira em cima da cama...
Ela pegou a cadeira da penteadeira e arrastou o colchão da cama para por a cadeira ali. Subiu na cadeira e se pôs nas pontas dos pés esticando os braços, suas mãos ultrapassavam um pouco o telhado, era o suficiente para que nós a puxássemos para cima. E foi o que fizemos. Sarah não era pesada, mas não foi fácil, tomamos o cuidado de tentar não fazer muito barulho, por fim, ela conseguiu se sustentar na beirada do buraco que abrimos e assim nós terminamos de puxá-la pela cintura com algumas palavras de reprovação, mas ela mesma entendeu que não tinha outro jeito.
Ela sentou-se ao meu lado, fiquei entre ela e Charlie. Lá ficamos até recuperarmos o fôlego pelo esforço, eu evitava olhar para ela, continuava meio envergonhado. Do telhado víamos a copa das árvores mais altas, e por detrás delas as montanhas nos cercavam por todos os lados, víamos o caminho do rio de águas claras e sentíamos o vento batendo em nosso rosto suado, o sol estava quente, mas agradável. Senti que podia ficar ali para sempre e sorri feliz por Sarah estar ao meu lado. Ela pegou minha mão.
- Isso foi bem legal! É muito bonito aqui em cima, não acha? – disse ela sorrindo e me encarando, sorri e acenei em resposta. Ela desviou o olhar pra Charlie e riu. – Agora já sabemos como fazer aquele passeio noturno.

10 comentários:

J.Pedro disse...

Maneiro

Guilherme Bayara disse...

Gostei bastante!
Vou ler desde o inicio para compreender melhor!

Lenivaldo Silva disse...

Velho,parabéns pela iniciativa.
mas infelizmente,não leio hstórias em blogs.Quem sabe quando virar um livro...
o titulo é fácil de fixar,então quando ouvir falar de O menino que esquecia o passado,de Esther Saldanha,sa sei de onde foi...
Abração.

Gutt e Ariane disse...

Consertando o telhado, mas com uma intenção não declarada... certo, certo... faz parte das jogadas do amor! rsrs

Jaqueline Bertoldo disse...

parabéns pelo blog, gostei da história. e boa sorte. abraços.

Diego Augusto disse...

Adorei a historia de mais vou fikar acompanhando os capitulos viu nuam esqueça de sempre avisar novos post!

André disse...

nossa...
1ª vez que vejo historia em blog mas fico foda *---*

Fê Gugelmin disse...

MEEEEEEEEEEEEEENINA! Você é escritora né? Meu Deus, escreve muito bem *-*
vou pegar o capitulo 1 pra entender direito *-*

bjbj e sucesso!!

Anônimo disse...

E aqui estou eu..rs
Ainda não li essa história, mas rpometo que lerei ela toda, assim que você publicar o livro dela.rsrsrs

Torcendo pra que isso aconteça.

Beijooos

PS: você será a minha próxima vítima*;

Dani Linno disse...

Lindoo..to seguiindo beijos!